sábado, agosto 7

Introdução Sermão de santo Antonio

SERMÃO DE  SANTO ANTÔNIO
Roma - 1671
Luzes e Sombras, no Reino e na Humanidade
J. Jorge  Peralta
Apresentação 
O Sermão de Santo Antônio, que aqui publicamos, é um texto que envolve uma problemática muito complexa. Foi elaborado em Roma, em 1671.
É um painel de paradoxos. Deve ser lido após a leitura do Sermão de Santo Antônio, pregado no dia 13 de junho de 1670. Um ano antes.
            Aliás, é o próprio Vieira quem faz o elo entre os dois Sermões:
“Hoje faz um ano que preguei aos portugueses as luzes da nação... agora lhes descobrirei, a eles e a todos, as sombras dessas mesmas luzes
Cada um dos dois Sermões é parte de um todo: Luzes e Sombras.
O de 1670 é a primeira parte  e o de 1671 é a segunda parte.
O Sermão de 1670, fala com arrebatado entusiasmo, das Luzes, isto é, das Glórias e Grandezas da nação Portuguesa. O Sermão de 1671 fala, com um certo constrangimento, das sombras da nação. O primeiro Sermão é Panegírico; o segundo é de caráter mais declamatório do que panegírico. São as duas faces da mesma moeda.
É o próprio Vieira que nos dá esta explicação, no Sermão de 1671.

Os dois Sermões propõem o verso e o reverso de suas perspectivas, em relação ao presente e ao futuro de Portugal, na História do Mundo, tendo como eixo paradigmático condutor a obra do grande sábio e taumaturgo, Santo Antônio.
Santo Antônio, com sua vida complexa de peregrino pelo mundo, serve, à perfeição, de paradigma de como Vieira vê as grandezas e as misérias de seu povo, de quem profetiza uma missão grandiosa na História. 
Só uma pessoa muito sábia é capaz de mostrar, depois  da grandeza que deslumbra, a miséria que constrange.
Com a mesma força e ousadia de sempre, Vieira não se omite; fala a verdade, ainda que dolorida, para corrigi-la. Aliás, ao apontar as sombras da nação, realça as luzes, aclamadas no Sermão anterior.
Num mundo hipócrita e farisaico, isto poderá parecer apontado  como um desvio de caráter, talvez como vingança. Os hipócritas poderão pensar assim, mas não procede.
Vieira sempre disse ao seu país o que ele precisa ouvir, para sanar desvios, que outros escondem.
Vieira sempre foi um homem leal, destemido, transparente e ousado.
O leitor de Vieira precisa deixar de lado toda a hipocrisia e farisaísmo.

Então os dois Sermões, considerados complemento um do outro, devem ser lidos, no contexto  da grande obra a que Vieira  se dedicava, desde 1664: A Clavis Prophetraum (Chave dos Profetas), de que  faz parte a “História do Futuro”, um Tratado filosófico-teológico. Na Clávis Prophetarum e na História do Futuro, que Vieira considerava ainda mais importante do que seus Sermões, o Grande orador pretendia registrar o seu grande  legado intelectual à Humanidade.
A História do Futuro foi preservada integralmente. Da Clávis Prophetarum restaram amplos textos, mas grande parte foi extraviada. São edições disponíveis das duas obras.

O presente Sermão (1671) não pôde ser pregado, por alegado motivo de doença. De qualquer forma o Sermão não poderia ter sido pregado. Sozinho, sem o texto de 1670, que era a primeira parte, luminosa, do tema, o Sermão, ao tratar das sombras de Portugal, poderia e certamente seria usado amplamente pelos inimigos de Portugal, sempre ávidos de elementos para desprestigiar o país, principalmente pela Espanha, o inimigo histórico. Inacreditável, mas é verdade.

Como os grandes Sermões de Vieira eram imediatamente reproduzidos, com muitas falhas, por assistentes que os decoravam precariamente e logo estavam a venda em livrarias da Espanha, da Itália e da Alemanha, expor o assunto deste Sermão, sem o seu anterior, que lhe dava o suporte, seria tomado como um ataque desleal ao seu país. Teria efeito oposto ao pretendido, o que seria politicamente inoportuno e arriscado...

Neste Sermão, Vieira faz críticas cáusticas ao país e à sua ingratidão com os próprios filhos. Diz e prova.
Noutro país, dificilmente alguém faria um sermão deste teor, principalmente a Espanha, onde não faltaria matéria assustadora, que os países escondem ou omitem.
São monumentais às grandezas ao país, como decantou, no Sermão de 1670, mas também não lhe faltavam sombras que precisavam ser denunciadas ou mostradas para que se corrigissem.
Diz o Orador:
Oh pátria, tão naturalmente amada, como naturalmente incrédula! Que filhos tão grandes e tão ilustres terias, se, assim como nascem de ti, não nascera juntamente de ti e com eles a inveja que os afoga...
INVEJA é uma das palavras-chave deste Sermão.
Vieira denunciava a ingratidão de Portugal, para com os grandes  filhos que o País gerava.
A bem da verdade, não é Portugal que comete tais desatinos, mas alguns de seus filhos desleais e traiçoeiros...  

Vieira sofria, na própria carne, a costumeira ingratidão e inveja  de alguns de seus compatriotas. Vieira, uma das inteligências mais prodigiosas, entre tantas outras que Portugal produzia, sofreu grandes dissabores e perseguições  dos próprios patrícios.
Vieira era apaixonado por Portugal, por suas luzes e grandezas, que o projetavam no mundo, prognosticando, como prenúncio, seu grande futuro, que o passado lhe garantia. Mas não podia tolerar  a ingratidão e a inveja de alguns, que apequenavam a nação.

No entanto, para que não parecesse que tinha sido contaminado pela negatividade, que tanto repelia, mostrou como as sombras que há em sua Pátria, são achaques de toda a humanidade, em maior ou menor escala, e que já estavam bem presentes na história bíblica. São fraquezas graves de alguns humanos sem caráter.
No entanto, o seu foco estava em sua Pátria, que queria ver sanada de tais desmandos, principalmente da inveja, que procurava destruir as pessoas mais capazes de conduzir o país.
O Quinto Império do Mundo que ele prognosticava,  na Clávis Prophetarum, precisava sanar a perseguição às pessoas de valor que o país produzia. Por isso, neste Sermão, ele mostra o caminho...
É sob estas luzes leais que o presente  e ousado  Sermão deve ser lido, com grande proveito. Aguça a nossa visão e a nossa consciência cívica.




Para ler o SERMÃO DE SANTO ANTÔNIO, 1671 (Clique)

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